Essas coisas são estranhas e não acontecem com frequência. Elas quase nunca acontecem. Por isso, quando ela sentiu aquela sensação pensou que tinha que aproveitá-la.
Funcionou mais ou menos assim: um milhão de vezes eles se cruzaram e se encontraram na escada do trabalho. E ela nem notou que um certo dia dividiram a mesma mesa naquela cerveja de fim de expediente.
E de repente, assim, quase que instantaneamente, uma série de acasos fizeram com que ela tivesse que falar com ele.
Por causa das circunstâncias, ela não entendeu muito o que estava sentindo. Mas era um estranhamento bom. Como se de repente compreendesse o porquê de estar ali. Com o passar dos dias, ela experimentou uma das sensaçoes mais gostosas e que lhe faziam tanta falta: identificação.
Não era essa identificação corriqueira. Não compartilhavam apenas o gosto musical. Compartihavam sensibilidade. Era diferente. Começou a lembrar das vezes em que tinham se cruzado. E do quanto ela nao fazia ideia, ela nem imaginava...
Era meio confuso.
Ela queria conviver com ele pra sempre. Ainda não entendia se juntos ou separados, mas definitivamente pra sempre.
sábado, 28 de agosto de 2010
sexta-feira, 19 de março de 2010
O barco e o bote
Era um barco grande. O único tripulante, um marinheiro de olhos negros e pensamento distante, muito distante.
Um pequeno bote amarelo balançava, logo ao lado. E a menina acenava, tentando se fazer vista. Já estava escurecendo e ela começava a se sentir cada vez menor.
O marinheiro olhava em sua direção. Dava até a impressão de que fazia contato visual com a menina do bote inflável.
E então ela arregalava os olhos:
- Ele me viu, vou sair daqui!
Mas o marinheiro... O marinheiro nada.
A menina mordeu os lábios quando notou a água dentro do bote, subindo perversa e lenta. Acenou com mais força.
Ele olhava na direção do bote e um esboço de sorriso parecia brotar em seu rosto.
- Sim, ele me viu, agora ele me viu! - comemorou.
Mas o que ele fez foi virar a cabeça para contemplar o infinito, sem se voltar para a menina.
E ela agora, encharcada, ajoelhada desajeitadamente dentro do bote, se encolheu, sem outras opções. Era um vazio tão grande...
De repente, uma terceira embarcação. Um barco azul e branco se aproximou e de onde surgiu, a menina nao compreendeu. Os tripulantes do barco a retiraram do bote e lhe ofereceram roupas secas.
O barco azul e branco foi se afastando dali. A menina se aproximou do parapeito vagarosa e, com as mãos em cima das sobrancelhas, apertou os olhos mais uma vez focalizando o ponto em que tinha estado à deriva. Só então se deu conta de que o marinheiro solitário nao era um marinheiro.
Era um náufrago. E afundava em seus próprios pensamentos.
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